Crônica sobre o filme – O Cisne Negro –

Compartilhe

Resolvi fazer alguns comentários sobre este filme que concorre ao Oscar. Penso que o público leigo, não muito familiarizado com os fenômenos do mundo imaginário ou psíquico, poderá se confundir com as cenas do filme. O diretor mistura cenas reais com sonhos e imaginações da personagem principal, Nina a bailarina.

Nina almeja um papel principal na companhia de dança, mas tem dificuldades que atrapalham esta caminhada. É talentosa, mas tem pouca criatividade, alegria e espontaneidade. Busca a perfeição, mas perde sua capacidade de ousar. É uma mulher com talentos para a dança, mas sua vida emocional, afetiva e sexual é pobre e infantilizada.

Tem uma grande dependência da mãe, aquém ama e odeia com a mesma intensidade. Para manter a mãe grudada, ela se torna submissa e “meiga” e desenvolve rituais de autoagressão, se coçando até sangrar. A mãe é controladora e competitiva e tenta realizar-se através do sucesso da filha. Teme perder a filha se esta for cuidar efetivamente de sua vida.

O diretor do bale pergunta ao bailarino se “transaria com Nina”. A resposta que fica no ar é: não. Nina não exala cheiro de mulher, não sabe seduzir um homem e nem ao público.  Grita para ela: solta-se. Balbucia no seu ouvido: você é o único obstáculo para seu sucesso.

Seu quarto é cheio de bichinhos de pelúcia, não é um quarto de mulher. A repressão aos impulsos sexuais está colocada na figura da mãe, mas esta repressão pertence a Nina.

Com a evolução do filme, Nina vai matando no seu imaginário suas opositoras e rompendo com seus medos. Vai tendo contato com seus desejos sexuais, através de sonhos ou imaginações: masturbando-se, tendo uma relação homossexual, beijando e sendo tocada pelo diretor artístico ou usando drogas.

Nina não é uma pessoa com doença mental grave e nem entrou em surto de loucura. O que aparece no filme de fantasmagórico é simbólico, ou seja, não aconteceu, é vivido no imaginário. Ela vai superando as dificuldades. Começa a desafiar a mãe, permite masturbar-se, joga fora os bichinhos e assume o papel do Cisne Negro. Ela vai se curando de sua “neurose”. Vai ingressando na vida como ela é. A vida real.

Todos nós temos muito de Nina em nossas vidas. Buscamos contato com as pessoas através da razão, ou seja, a perfeição. É mais difícil nos relacionarmos por meio de verdades, afetos e sentimentos. Debitamos nos outros, com frequência, nossas limitações para crescermos profissionalmente. Tememos nos separar dos pais, desejamos que eles nos cuidem para o resto da vida, mas isto tem um alto preço em nossas vidas emocionais. Se não procurarmos assumir quem somos e o que desejamos, fatalmente seremos infelizes e adoentados emocionalmente.

Dr. Nelio Tombini


Compartilhe

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

×
Iniciar conversa
Precisa de ajuda?
Olá! Podemos ajudar?