O feminicídio e a doença mental

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A mídia tem dado especial atenção aos casos de feminicídio, mas, não sei se aumentou o número de feminicídios ou se o assunto está sendo olhado com mais atenção pela sociedade e autoridades policiais.

Percebam que são raros os casos em que as mulheres matam seus companheiros diante de conflitos similares. As mulheres raramente são precursoras de assaltos, roubos ou homicídios, logo a agressividade é mais inerente ao macho. Evidente que o fato de vivermos no Brasil, onde predomina a cultura machista e em que o homem imagina ter direitos adquiridos sobre a mulher, contribui para o aumento de casos.

As autoridades policiais e a sociedade têm se mobilizado através de campanhas para prevenir os feminicídios. No entanto, percebo pouca ou nenhuma palavra da mídia e das entidades  a respeito da presença de doença mental na grande parte destes homicidas. A doença mental é negada em nossa sociedade e existe muito preconceito em relação a mesma. O doente mental, com características paranoides (desconfiado, ciumento, agressivo) ou com dependência química (álcool, maconha, drogas sintéticas, cocaína) normalmente não se percebe doente. Estes sujeitos são potencialmente violentos em qualquer tipo de relação. Às vezes, para piorar, o casal costuma consumir drogas juntos. A doença mental ainda passa despercebida na rede social. Só damos atenção quando a pessoa está completamente louca, falando sozinha, saindo para rua despida ou brigando, completamente descontrolada.

Não posso deixar de considerar o papel da mulher que se relaciona com estes homens “doentes”. As histórias mostram que  algumas delas vêm sendo agredidas durante algum tempo, mas tendem a não dividir com ninguém a situação difícil que vivem. Por que agiriam assim? Imagino que possam ser moças com baixa autoestima, que percebem que se acompanham mal, mas acreditam que, se fizerem tudo que podem e não podem, irão mudar este agressor para melhor e, não ficarão solitárias. Se revelassem a situação que enfrentam, teriam chance maior de serem ajudadas, mas, por outro lado, penso que estariam fazendo uma confissão pública da incapacidade de se acompanharem melhor.

Todos nós podemos carregar sentimentos de onipotência, achando que damos conta de coisas que, de fato, não damos conta. Faço um apelo às mulheres que percebem seus companheiros desequilibrados. Vincule a continuidade da relação à busca de uma consulta psiquiátrica acompanhada por você, pois muitos precisarão tomar medicação para poderem se relacionar de uma maneira mais saudável. Em situações como essas, é importante que você também busque ajuda de um terapeuta e divida suas histórias. Isso poderá salvar vidas. Nós não conseguimos mudar as pessoas por mais que tenhamos nos doado ou submetido.

Peço aos leitores que não considerem estas minhas observações como justificativa para que as mulheres sejam agredidas. Não há justificativas, mas diversos aspectos influenciadores. Trago algumas reflexões para que possamos estender essa discussão, tão importante nos dias de hoje.

Nelio Tombini
Médico psiquiatra (CRM/RS 5440)
Psicoterapeuta
Palestrante
Autor do livro A Arte de Ser Infeliz – desarmando as armadilhas emocionais


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